Quando se trata de construir em madeira, muita gente acaba não consultando um profissional capacitado e especializado pra fazer o projeto estrutural e acaba realizando o trabalho, vamos assim dizer, pelas “próprias mãos” ou até mesmo contratando algum carpinteiro confiando na palavra do mesmo. Nada de errado em se fazer desta forma, uma vez que a madeira é um dos pouquíssimos materiais que tem o conceito do “faça você mesmo” implícito. Peças curtas, leves e com alta resistência mecânica dão à madeira a praticidade que se precisa quando a obra não requer muitos detalhes técnicos e muita responsabilidade estrutural. Porém, já que vamos fazer “nós mesmos” o que pode dar errado ao se construir com madeira?
1) Flambagem lateral : Em outras palavras, é quando a madeira “entorta” lateralmente ou “encanoa”. Isso ocorre por um único fator, a relação entre base e altura da peça é desproporcional. A peça é muito “fina” e muito alta, aí ela acaba “encanoando” pra face mais larga, porque a base não é grossa o suficiente pra conter a tortura da madeira. É claro que essa propriedade está também ligada ao comprimento da peça. Quanto mais comprida, mais ela tende a flambar lateralmente.
Solução :
– Aumentar a espessura da peça (ou diminuir a altura!);
– Travar a peça pela lateral a cada “x” centímetros;
– Na prática se a altura (h) dividida bela base (b) for menor que 4, não precisa (em teoria) de travamento lateral, veja alguns exemplos:
Uma vigota de 6x12cm temos h/b = 12/6 = 2 (não precisa de travamento)
Uma tabeira de 3x20cm temos h/b = 20/3 = 6,66 (precisa de travamento)
Obs.: Em assoalhos e decks muito largos pode ocorrer o “encanoamento” das peças por má secagem da madeira. O lado que fica “pra cima” tomando mais sol, seca mais rápido que o lado de baixo, mais úmido. A parte superior “encolhe” por evaporação da água puxando as laterais, e aí caracterizando o encanoamento. Pra evitar esse tipo de situação recomendo usar no mínimo 2 pregos, ou parafusos nas réguas e espaçar os barrotes entre 40cm e 50cm, pelo menos (pra assoalhos com 2cm de espessura).
2) Falha na flexão (flecha) : Uma das primeiras coisas que percebo em estruturas de madeira mal dimensionadas é a falha por flexão, a chamada “flecha”. É quando a peça “embarriga” pra baixo. Normalmente isso acontece por excesso de carga na peça e pode ter três estágios: O primeiro é a flecha pura e simples, muito comum de acontecer. Nela a peça embarriga, porém permanece torta, sem dano estrutural algum, apenas estético (mas feio!). O segundo é a falha na face superior das vigas onde ocorre a compressão das fibras, essa falha é mais rara e geralmente não causa o colapso da peça. O terceiro, mais comum e mais grave, é a falha na parte inferior da peça causada pela tração das fibras inferiores. É grave porque ela acontece por causa da tração das fibras mas imediatamente a peça é “rasgada” (cisalhamento), causando uma fratura irreversível.
Solução :
– Aumentar espessura e/ou altura da peça;
– Na prática ver qual o vão que a peça vai vencer (em cm) e dividir por 17 pra saber a altura aproximada da peça que vence este vão sem fletir, por exemplo:
Vão livre de 4,00m temos 400/17 = 23cm (aproximadamente, depende da carga solicitante e da espécie)
3) Cisalhamento horizontal : Uma das causas mais comuns de perda de resistência das peças de madeira é quando aparecem “fissuras” horizontais nas vigas. É como se a parte superior da peça “descolasse” da parte inferior, fazendo com que elas deslizem e assim aumentando a deformação. A fissura normalmente ocorre próxima dos apoios, na zona de maior carga cortante. É exatamente por isso que não dá pra simplesmente colocar uma viga em cima da outra pra vencer um vão maior. Elas vão “escorregar” entre si e deformar igualmente.
Solução :
– Correto dimensionamento das vigas;
– Em vigas duplas usar parafusos, anéis metálicos ou adesivo estrutural para fazer a união entre a peça superior e a inferior, de modo à zerar o escorregamento entre as peças;
4) Exposição à umidade : A causa mais grave do colapso nas estruturas de madeira, sem dúvida é a deterioração das peças por exposição à umidade. Peças úmidas atraem fungos apodrecedores, insetos xilófagos, causam amolecimento das fibras e reduzem a resistência da madeira.
Soluções :
– Usar madeira seca sempre que possível;
– Aplicar produtos hidrorrepelentes (stains, vernizes) na superfície das peças;
– Usar a espécie correta para cada tipo de aplicação;
– Evitar contato direto com a terra nas fundações;
– Proteger a face das peças expostas à umidade com um rufo;
Lembre-se sempre : Madeira pode molhar sim, só não pode acumular umidade!
5) Conexões mal feitas : Tenha sempre em mente que a madeira tem baixa resistência à esforços perperdiculares às fibras, tem pouca resistência ao cisalhamento (corte) e tem resistência bem favorável à compressão. Por isso, evitem conexões complexas, especialmente aquelas que solicitam as tensões perpendiculares e cisalhamento (corte) das fibras. Sempre que possível, projete conexões que solicitem a madeira à compressão. Quando usar ligações com pregos ou parafusos, na prática, dê um espaçamento de 6 ou 7 vezes o diâmetro entre um elemento e outro, para evitar “trincas” entre eles.
Claro que existem muitos outros fatores a serem considerados quando se constrói com madeira, porém espero que estas dicas os ajudem a construir melhor com este material tão fascinante!
Texto : Eng. Alan Dias
Obriga pela dica. A minha dúvida é, se uma terça tem um vão de 6,0 m e está espaçada a cada 2,0 m, a relação para calcular a altura ainda sim é de 1/16 ou 1/18?
Olá, a resposta é : qualquer uma das duas. Como é apenas pra um pré-dimensionamento, está valendo. Eu recomendo consultar um engenheiro estrutural para fazer o cálculo exato depois quando for realmente executar a obra!
Boa tarde! Gostaria de saber qual vão máximo o CLT vence, além do balanço máximo que ele suporta.
Além disso, gostaria de dar uma sugestão de postagem para vocês: como realizar o pré dimensionamento de uma estrutura em clt, voltado para arquitetos, citando os cuidados estruturais que devem ser pensados no projeto. Tenho pesquisado muito sobre isso, mas no geral encontro materiais muito básicos ou profundos demais (focando em engenheiros civis). Muito obrigada!
Espaço informativo excelente! Informações consistentes e valiosas.
Obrigado!