Desde que eu comecei a trabalhar com estruturas de madeira, no ano de 1998, tivo o prazer e o privilégio de conhecer grandes nomes das Estruturas de Madeira no nosso país. Muitas dessas empresas já nem existem mais, mas foram muito importantes para o desenvolvimento da Madeira no Brasil. Vou tentar resumir em poucas palavras a história de algumas delas abaixo. Foi um grande trabalho encontrar informações sobre as mais antigas, fruto de uma enorme pesquisa que desenvolvi. Talvez esse texto seja atualizado conforme a história vá crescendo e novas informações sejam adicionadas. A história merece ser contada, registrada e sabida por todos pra podermos evoluir respeitando os grandes engenheiros que vieram antes de nós.

I) ESTRUTURAS HAUFF

Não podemos contar a história das estruturas no Brasil sem antes falarmos do precursor das estruturas de madeira por aqui no início do século XX. Os grandes sistemas estruturais de coberturas em madeira aqui em nosso país se originaram pela empresa HAUFF, fundada pelo austríaco ERWIN HAUFF, que contribuiu muito para o avanço tecnológico das estruturas de madeira em nosso país.

Hauff nasceu em Viena na Áustria e formou-se pela Escola Politécnica de Munique na Alemanha, concluindo seu curso de engenharia civil em 1920. Depois da primeira guerra mundial, ele veio ao Brasil estudar as espécies tropicais de madeira que aqui tinham abundância. Para isso colhia amostras das mais variadas espécies, observando seu comportamento em relação à secagem, empenamentos e rachaduras. Durante a década de 20 Hauff construiu diversos tipos de coberturas para armazéns, depósitos, pontes e cimbramentos, fundando a empresa HAUFF em 1929. Hauff construir por aqui diversas estruturas de madeira treliçadas e cavilhadas, sendo reconhecido internacionalmente pela Escola Politécnica de Munique como professor catedrático pelo trabalho desenvolvido no Brasil.  Além disso, Hauff contribuiu para a elaboração da primeira norma de estruturas de madeira brasileira, a NB-11 de 1951.

Nesta foto podemos ver uma ponte sobre o Rio Tietê em São Paulo, com 38m de vão livre e comprimento total de 48m, era uma ponte rodoviária.

Já a ponte de Guarulhos, foi considerado o maior vão livre da América do Sul, com 52m de vão livre com tabuleiro de 3,30m de largura.

O sistema HAUFF de estruturas de madeira foi largamente utilizado pelo país até os anos 50. Esse sistema era caracterizado por cobrejuntas, sambladuras e cavilhas de madeira empregadas nas ligações das barras aos nós dos elementos estruturais com peças múltiplas e compostas. Esse sistema foi uma inovação na época permitindo vencer grandes vãos livres.

O ginásio da quadra de tênis do estádio do Pacaembu foi construído nesse sistema treliçado tipo Hauff em 1939 com vãos livres de 40m.

Ginásio de Pacaembu nos dias de hoje

No ano de 2020 tive o privilégio de ser contratado para fazer a recuperação de toda a estrutura de Erwin Hauff e deixá-la com um aspecto melhor, restaurando peças, trocando partes apodrecidas e substituindo a telha original por telhas metálicas trapezoidais termo-acústicas. Com esse reforma acreditamos que a estrutura poderá durar pelo menos mais 50 anos.

Hauff construiu a estrutura do Centro Acadêmico da Escola de Engenharia Mauá em São Paulo, onde eu estudei.

Estrutura do C.A. da E.E.Mauá nos dias de hoje

Outra estrutura interessante que Hauff construiu foi o galpão da VARIG no Aeroporto de Congonhas em 1949 com 70m de vão livre.

Depois de Hauff, algumas outras empresas surgiram no Brasil no ramo das construções em madeira. Dentre elas destacam-se a empresa ESMARA LTDA no Rio Grande do Sul, o ESCRITÓRIO DE ENGENHARIA CAVIÚNA no Paraná e em São Paulo a SPILBORGHS & CIA LTDA, a SOCIEDADE TEKNO LTDA a ALT GOPPERT & CIA LTDA, a FIBROTÉCNICA LTDA, a PAUBRASIL ENGENHARIA LTDA, a ARCOTECNICA e a CALLIA & CALLIA.

II) SPILBORGHS & CIA LTDA

Na foto um galpão de arcos lamelares construído pela SPILBORGHS em 1950.

Aqui algumas propagandas da revista Acrópole, que circulou nos anos 40 e 50 e tratava de construção e arquitetura. Destaque para o Engenheiro assistente que na época trabalhava na Spilborghs, Dr. Edmundo Callia, que foi meu chefe durante os anos de 2005 a 2010 quando eu trabalhei na Callia Estruturas de Madeira.

III) SOCIEDADE TEKNO

Nesta foto, outro galpão lamelar construído nos anos 50, desta vez no Rio de Janeiro, pela Sociedade Tekno.

A sociedade TEKNO, comandada pelo engenheiro Enio Perrillo construiu a cobertura do Ginásio municipal de Sorocaba nos anos 50.

Ginásio de Sorocaba hoje em dia

VI) PAUBRASIL E ARCOTÉCNICA

A história do Leto Alexander Sneiders é a história da Paubrasil e da Arcotécnica. Alexandre veio da Letônia para o Brasil com seus pais em 1949 e em 1951 foi trabalhar como desenhista nas Estruturas Hauff de Madeira.

 Autodidata, Alexander teve que aprender logo sua nova tarefa, pois seu primeiro trabalho foi passar a limpo o projeto da estrutura de cobertura dos estúdios cinematográficos da Vera Cruz em São Bernardo do Campo. Seu material de trabalho eram canetas a nanquim, lapiseiras, papel vegetal, réguas, borrachas, estiletes e prancheta.

Pavilhão dos Estúdios Vera Cruz em SBC (HAUFF)

Sua aptidão natural para o desenho o fez crescer dentro da firma, a ponto de uma empresa concorrente, a Fibrotécnica, lhe oferecer um salário quase dobrado para se transferir – o que ocorreu em 1954. Nestes anos Alexander foi adquirindo conhecimento prático, não só para desenhar como também para calcular e projetar estruturas e coberturas de madeira. Para tanto, serviu-se do contato com engenheiros experientes e diversas visitas em canteiros de obras.

 Em 1964, Sneiders e um sócio fundam a Paubrasil Engenharia Ltda. Os trabalhos foram se sucedendo a ponto de abrigar mais um sócio, 23 funcionários somente no escritório – entre engenheiros, projetistas, desenhistas técnicos e auxiliares – além de 80 carpinteiros nos canteiros de obras.

Hangar em fazenda do Mato Grosso, projetado e construído com a consultoria de Alexander Sneiders

Logo a Paubrasil ganhou fama e as encomendas não pararam de chegar. Cada obra era orçada nos milhares de metros quadrados de cobertura e a carteira de clientes contava com empresas do porte da construtora Camargo Correa, do banco Bradesco e da indústria química Basf. A Paubrasil, sob a direção técnica de Alexander Sneiders, chegou a cobrir vãos de até 40 metros com estruturas de madeira, através de tesouras – o método mais comum – e arcos. Os arcos de madeira que venciam grandes vãos exigiam conhecimento técnico que poucas empresas concorrentes dominavam, fazendo da Paubrasil uma referência no mercado brasileiro.

Por volta de 1974 a Paubrasil foi comissionada pela Ford para cobrir e fechar em Taubaté, no Vale do Paraíba em São Paulo, uma fábrica de motores, com a vultosa área de 120 mil metros quadrados. O resultado agradou tanto a direção da filial brasileira da Ford, que cada sócio da empresa foi agraciado com um Maverick zero quilômetro, retirado diretamente da linha de produção por valores que cobriam apenas meras formalidades.

Ao todo a Paubrasil cobriu cerca de 620 mil metros quadrados até o ano de 1980, quando Alexander vendeu sua parte na sociedade para o pianista João Carlos Martins. Sneiders sempre foi um profissional mais de campo do que de atividades burocráticas, e isso de certa forma o fez perder o controle administrativo da empresa, que havia criado, para os outros dois sócios. Além disso, havia recomendações médicas para diminuir o ritmo de trabalho.

Construção da fábrica da Quimbrasil em Uberaba, Minas Gerais

A grelha de concreto pré-moldado recebe os arcos de madeiras, em construção de 7.600 metros quadrados.

A associação entre os nomes da Paubrasil e Alexander Sneiders era tão grande que, mesmo depois de mais de dez anos, ele foi procurado pela imprensa em função da Paubrasil, por intermédio de João Carlos Martins, que era amigo do político Paulo Maluf, ter ingressado no rol de colaboradores de campanhas eleitorais, em condições não permitidas pela lei da época. Sneiders teve que explicar que não tinha mais qualquer relação com sua antiga empresa.

Neste período, Alexander já havia criado a Arcotécnica, com apenas dois funcionários no escritório e 12 carpinteiros atuando nos canteiros de obras. A Arcotécnica tinha, portanto, um décimo do tamanho da Paubrasil, mas obteve igualmente grande êxito no mercado, trabalhando em obras de menor porte, é verdade, mas igualmente qualificadas. Quando a Arcotécnica foi contratada por representantes do Vaticano para cobrir a fábrica de cimentos Santa Rita, em Cubatão, perto de São Paulo, Alexander Sneiders teve a oportunidade de estreitar contatos com o mestre Antonio Moliterno, professor da Escola de Engenharia da Universidade Mackenzie e autor do livro “Caderno de projetos de telhados em estruturas de madeira” – entre outras publicações de relevância semelhante para estudantes de Engenharia e Arquitetura.

Nesta obra para a Fertiza, as treliças de madeiras foram confeccionadas e estocadas no solo, e erguidas por guindastes.

Alexandre Sneiders cobriu mais de um milhão de metros quadrados com suas estruturas em madeira. Faleceu em março de 2020 aos 88 anos de idade.

V) CALLIA & CALLIA + LAMINARCO

Na foto acima podemos ver um pórtico triarticulado para uma usina de cana de açúcar em Araraquara, chamada Usina Tamoio, construída nos anos 50 pela Callia & Callia.

Empresa que originou a LAMINARCO, pioneira em fabricação de Estruturas de Madeira Laminada Colada em São Paulo. Um pouco da história da Callia se encontra com seu fundador, o Engenheiro Edmundo Callia, que nasceu em Bari na Itália e veio para o Brasil nos anos 20. Depois que se formou na escola Politécnica, obteve um estágio no departamento de madeiras do IPT. Trabalhou por 2 anos na Spilborghs, da qual já falamos e em 1949 fundou a Callia & Callia LTDA junto com seu irmão. A primeira obra da empresa foi a cúpola do templo da igreja da Vila Formosa, existente até hoje. Uma obra memorável é a cobertura do cinema Valparaíso em Santana, com 64m de vão livre. O cinema foi inaugurado em 1962 e fechou nos anos 70. Em meado dos anos 80 o prédio foi demolido, e com ele sua estrutura de madeira. Foi o grande pioneiro das estruturas lamelares no Brasil, tendo construído a primeira em Piracicaba com um vão de 29m.

A Callia & Callia projetou e construiu as coberturas do mercadão da Lapa em São Paulo.

Construção da estrutura do Ginásio de Esportes de Pinheiros na década de 50.

Cobertura de passarela em frente ao Teatro Municipal de São Paulo para o Carnaval de 1968.

Em 1965 a família Callia foi a pioneira na fabricação de vigas de madeira laminada colada e acabou abrindo a primeira fábrica de vigas de MLC do Brasil na região sudeste, em Itararé para fabricar peças com comprimentos até 12m e qualquer curvatura. Essa indústria se chamava LAMINARCO e foi altamente produtiva até os anos 80. Ela foi montada e gerenciada pelo engenheiro Vinício Walter Callia (irmão de Edmundo Callia), pesquisador do IPT de São Paulo e pioneiro no estudo e publicações sobre o tema no Brasil.

Clube de Regatas Jaó em Goiânia, construído no ano de 1963.

Uma das últimas obras da LAMINARCO foi a cobertura do Shopping Riviera em Bertioga, no início dos anos 80.

VI) ESMARA

Aqui vamos para o Rio Grande do Sul, onde fica a fábrica da Esmara Estruturas de Madeira, fundada pelo Eng. Fritz Hosch e funciona até hoje comandada pelo seu filho Andreas Hosch. O Engenheiro Fritz Hosch veio da ALemanha para o Brasil em 1953. Trabalhou na empresa Hauff, que tinha filial no Rio de Janeiro e em Salvador. Como a mão de obra aqui no Brasil não tinha nenhuma especialização na construção de madeira, muitas vezes os carpinteiros vinham de fora. Foi numa dessas que o engenheiro veio ao Brasil. Durante 3 anos o Eng Fritz trabalhou como empregado na Hauff. Foi quando conheceu outro engenheiro alemão, chamado Bruno Noack.

Os dois fundam a ESMARA em Curitiba, no ano de 1954 e construíram muitas obras na região até o ano de 1959, quando Fritz se muda para o Rio Grande de Sul, fundando a ESMARA em Porto Alegre. O brasileiro Omar Motter entra na sociedade no lugar de Bruno e a fábrica passa a operar fabricando estruturas e vigamentos de madeira pregada e parafusada de pinho araucária. Durante os anos 50 a grande demanda de estruturas de madeira no Brasil eram pra galpões graneleiros, de adubo e grandes pavilhões. Isso porque pra esse tipo de construção o uso da madeira é essencial, uma vez que o ambiente agressivo ataca fácil o aço, nada fazendo com a madeira.

Durante a feira Ligna, em Hannover na Alemanha, Fritz teve contato com a tecnologia das Madeiras Laminadas Coladas, e viu ali a grande oportunidade de iniciar a produção dessas peças no Brasil. A Esmara passou então a produzir MLC aqui com pinho araucária, chegando a ter 700 funcionários na época, construindo dezenas de galpões em todo território nacional.

Na foto vocês podem ver um galpão de madeira pregada na cidade de Vera Cruz no Rio Grande do Sul.

Arcos com seção tipo “I” cruzadas construídos pela ESMARA na década de 60.

Pórticos triarticulados de seção “I” com tábuas cruzadas de Pinho Araucária.

Cobertura do ginásio de esportes da Universidade de Passo Fundo na década de 70 com vão livre de 31m e MLC de Pinho Araucária.

Galpão em MLC

Foi em meados dos anos 80 que a Esmara se muda de Porto Alegre para Viamão. Vieram então as escolas de emergência do Governo do Estado, que eram construídas com painéis de Madeira Laminada Colada. Mais de 200 salas de aulas foram entregues à população. Com a proibiçao do uso do Pinho Araucária em 1987 a ESMARA foi a pioneira na utilização do eucalipto para produzir vigas de madeira laminada colada no Brasil. O Eng. Fritz faleceu no ano de 2005, quando seu filho Andreas Hosch assume a empresa, que funciona até hoje. Na foto galpão com pórticos de MLC de pinho araucária construído nos anos 80 pela ESMARA. Um grande engenheiro que trabalhou projetando e calculando muitas das estruturas da ESMARA foi o prof. Carlos Alberto Szucs.

VII) ZANINE CALDAS

Agora, não podemos falar sobre arquitetura em madeira no Brasil sem falar no nome de Zanine Caldas. Pra quem não conhece, Zanine nasceu na Bahia em 1919 e era paisagista, maquetista, escultor, moveleiro e arquiteto autodidata e por seu talento foi reconhecido como Mestre da Madeira. Foi na firma de Zanine, no Rio de Janeiro, que arquitetos como Lúcio Costa, Oswaldo Bratke e Oscar Niemeyer faziam suas maquetes. Nos anos 60, Zanine fou dar aulas de maquete na UnB em Brasilia, mesmo sem diploma. Construiu diversas casas no bairro de Joatinga, no RIo de Janeiro. A grande polêmica de Zanine foi ele ter sido barrado de construir seus projetos por não possuir diploma nem de arquiteto e nem de engenheiro. Porém, em 1991 Lúcio Costa teva a honra de entregar à Zanine o título de Arquiteto honoris causa atribuído pela IAB, pois dominava a técnica e materiais como ninguém.

Eu tive o prazer de visitar algumas obras de Zanine durante minha vida profissional, e inclusive recuperamos as bases de pilares de madeira em uma das casas do Zanine na Joatinga que haviam apodrecido. Isso em 2014.

Na foto, uma casa projetado por Zanine em 1988 e reformada em 2017 para um casal.

Notem a assinatura de Zanine nos caibros chegando de topo nos espigões e um domus quadrado central, sem tesouras, sem terças. Caibros estruturais.

Nesta foto da mesma casa em Brasília, tesouras com o banzo inferior à meia altura, levantando o pé direito da sala.

Uma das obras que fui visitar de Zanine em Brasília foi o Centro de Excelência em Turismo, na UnB. Acho esta estrutura simplesmente incrível, pois Zanine transformou um telhado 4 águas por fora em uma estrutura tridimensional por dentro.

O jogo de mãos francesas, caibros estruturais e beirais tipo “cachorro” – que é uma levantadinha na ponta – são marcas registradas do Mestre da Madeira.

Aqui uma foto minha na frente da obra de Zanine em Brasília.

Eu estava também fazendo uma obra minha na UnB, uma outra estrutura de madeira, chamada de Projeto Maloca, sala de aulas para alunos indígenas. Pra mim, uma honra ter uma estrutura no mesmo campus onde está Zanine e Lelé.

Pousada Pedra Azul – ES

Outra obra de Zanine que fui visitar e fiquei encantado foi a pousada Pedra Azul, no Espírito Santo. Eu também estava por lá construindo um sede de visitantes de madeira e não pude deixar de visitar a linda pousada de estrutura de madeira que o mestre projetou.

Cobertura da Pousada Pedra Azul no ES

Aqui mais uma foto do salão de festas da pousada Pedra Azul, em que Zanine mostra sua peculiaridade de projeto e construção com madeira brasileira. Simplesmente lindo.

VIII) SEVERIANO MÁRIO PORTO

Não posso deixar de citar o grande arquiteto Severiano Mário Porto, que construiu o Centro de Proteção Ambiental da Usina Hidrelétrica de Balbina, em Manaus no Amazonas. É a obra que mais goste dele, e infelizmente está em ruínas hoje em dia por falta de cuidados.

IX) ITA CONSTRUTORA

E assim continuamos a história, chegando nos anos 80 com a fundação da ITA Construtora, por Hélio Olga. A essa altura, Zanine já conquistava a todos com sua arquitetura em madeira, construída de modo artesanal : montava um gabarito do tamanho real da casa, serrava as madeiras, marcava as peças, fazia os encaixes, colocava num caminhão e mandava pra montagem em São Paulo. Aqui precisava de alguém pra montar. Foi aqui que entrou a família Olga, montando as casas de Zanine em São Paulo. A experiência deu certo e outras casas começaram a vir. Em 1982 Hélio construiu sua primeira casa, com desenhos de Zanine. As montagens e projetos continuavam a vir e em 1987 Hélio abre a fábrica para pré-fabricação de estruturas de madeira no sítio da família em Vargem Grande Paulista, onde está até hoje.

Casa Olga

Na foto podemos ver a Casa Olga, projetada pelo Arquiteto Marcos Acayaba, um ícone da construção em madeira no Brasil, com um toque de gênio ao aproveitar o declive imenso do terreno. Ela marca a mudança da fase artesanal de construção com madeira para a fase industrial, embutindo as ferragens e trazendo valor estético mais moderno às construções em madeira.

Casa Olga durante a construção

A casa Olga foi marcante pois uniu arquitetura, engenharia e técnica para a montagem. Realmente uma casa e um projeto incrível.

Casa Acayaba

Outro projeto admirável da ITA é a Casa Acayaba, no Guarujá em São Paulo. A estrutura em árvore travada por grelha de piso triangular, permite poucos pontos de apoio, como por exemplo 3 nessa obra, preservando o terreno natural.

Aqui uma foto da vista de baixo da Casa em Tijucopava, projetada pelo Arquiteto Marcos Acayaba.

Com o desenvolvimento dos métodos de industrialização e para atender aos desafios da arquitetura contemporânea, atualmente a ITA apenas utiliza madeira laminada colada de eucalipto.

Instalação de Escultura em Madeira Laminda Colada no Museu do Amanhã

X) CARPINTERIA ESTRUTURAS DE MADEIRA

Bom, agora vou falar um pouco da minha história com a madeira. Eu me formei em 1998 como Engenheiro Civil e na sequência fui trabalhar numa empresa chamada Regatta. Lá, eu e minha chefe na época, a Cláudia Garcia, desenvolvemos um departamento de construção de decks de madeira. Foi meu primeiro contato com a madeira. Comprávamos madeira de pinus tratado da Preservam e da Battistella pra fazer nossos decks, que eram contratados por paisagistas, arquitetos e decoradores. Eu coordenava os projetos e as montagens com as equipes nas obras. Comecei a aprender muito sobre construções de decks. Na época da Regatta conheci dois engenheiros da Battistella, o Montanha e o Partel. Eles eram os consultores técnicos da empresa e já estavam fazendo algumas obras de madeira laminada colada na época, como o Ginásio de Lajes, uma das maiores estruturas de madeira do Brasil. Foi quando numa dessas conversas com o engenheiro Montanha, ele veio na Regatta e ficamos debatendo sobre cálculo estrutural de madeira pela NBR 7190. Eu já tinha estudado madeira na faculdade, mas nunca tinha me aprofundado tanto no cálculo de estruturas. Essa conversa abriu um novo mundo pra mim nas estruturas de madeira.

Em meados de 2001 a Regatta Decks foi descontinuada e então vi uma oportunidade de continuar o trabalho com decks com minha própria empresa. Foi aí que nasceu a Espiral, uma pequena empresa de decks e agora também pergolados

Primeiro pergolado da Espiral, em Maçaranduba num comdomínio em Alphaville

Na Espiral, já tínhamos um leque maior de produtos e algumas estruturas que mereciam cálculo estrutural. Depois daquela conversa com o Montanha, eu comprei livros e livros sobre estruturas de madeira e os devorava, criando planilhas de Excel paramétricas para cálculo estrutural de vigas, pilares, ligações e tudo mais. Eu vi aí uma oportunidade de agilizar o cálculo de estruturas apenas com tabelas. Nessa época eu não tinha as mínimas condições financeiras de comprar softwares de cálculo, então… desenvolvi minhas tabelas. Nessa época fizemos muitas obras, todas elas pequenas mas numerosas, pelo Brasil todo.

Algo me dizia que dava pra ir além, dava pra fazer coisas maiores com madeira. Então a Espiral fechou as portas em 2004 pra que eu pudesse ir trabalhar com estruturas maiores. Trabalhei temporariamente com o Eng. Mauricio de Almeida, da Orbital, e tive a oportunidade de trabalhar, detalhar e calcular um pouco os projetos do Hotel Botanique em Campos do Jordão. Um projeto de estruturas de madeira lindíssimo. Como meu trabalho por lá era só temporário, senti o gostinho de trabalhar com grandes estruturas de madeira. Procurei o Hélio Olga pra ver se eu poderia ingressar na equipe. Na época não tinha vaga pra engenheiro na ITA mas ele me indicou uma outra empresa que talvez poderia me contratar. Foi aí que eu fui parar na CALLIA ESTRUTURAS DE MADEIRA, com a indicação do Hélio Olga.

Era o ano de 2005 quando comecei como engenheiro calculista na CALLIA. Tudo que eu sabia era o que eu aprendi na faculdade e meus livros e tabelas de cálculo no excel. Foi lá que tive contato com um dos pioneiros das estruturas de madeira no Brasil, o Dr. Edmundo Callia. Eu não tinha ideia da grandiosidade de seu trabalho na época, só fui ter quando ingressei por lá e tive acesso ao belíssimo acervo técnico de obras, cálculos, planilhas e fotos de obras antigas tanto da CALLIA e CALLIA como da LAMINARCO. Conheci meu sócio na Carpinteria, Paulo Bastos por lá. Durante minha passagem pela CALLIA, pude aprender junto com o Dr. Callia e seu filho Edmundo Callia a realmente pensar como se calcula madeira. Revi conceitos de cálculos como Cremona, regra dos 3 momentos, detalhamentos de grandes estruturas treliçadas, tesouras, madeira roliça, serrada e madeira laminada colada. Eu devo toda a minha base de formação como calculista de estrutura de madeira à estes senhores.

Ah e pra quem não sabe, o Paulo foi desenhista e projetista da Lina Bo Bardi e do Marcelo Ferraz.

Durante os anos de 2005 até 2010, na época em que estive por lá,  a CALLIA fazia os cálculos e detalhamentos para a TORA, uma indústria de estruturas de madeira e LOG HOUSES que existiu aqui no Brasil. A TORA foi a primeira indústria de estruturas de madeira a trabalhar com uma CNC vinda da Alemanha, uma Hundegger K2 (que mais tarde foi adquirida pela ITA).

Nessa época eu criei também o primeiro BLOG de estruturas de madeira do Brasil, o estruturasdemadeira.blogspot.com, que ainda está no ar e conta com mais de 2 milhões de acessos. Ele durou 10 anos e trouxe para o Brasil informações sobre estruturas de madeira que eu encontrava, textos que eu mesmo escrevia, fotos de obras, discussões, etc.

 No ano de 2009 infelizmente o Dr. Callia veio a falecer. Então, eu e Paulo deixamos o escritório para abrir então a CARPINTERIA ESTRUTURAS DE MADEIRA em 2010. Por coincidência do destino, nossa primeira obra foi um deck e alguns gazebos para a danceteria PUCCI na Riviera de São Lourenço, em São Paulo.

Estrutura roliça projetada por mim na época da CALLIA e fabricada e construída pela TORA LOG HOMES em Pedra Azul no ES

Na Pedra Azul no ES com uma de minhas estruturas de madeira roliça na época da CALLIA, construída pela TORA LOG HOMES – Ano : 2006

Torre de Igaratá com 10 andares, em 2009 uma das primeiras obras da Carpinteria

A ideia da CARPINTERIA era não apenas ser um escritório de cálculo e detalhamento estrutural, como estava sendo a CALLIA. A gente queria ir pra obra, executar nossos projetos, botar a mão na massa. Eu e o Paulo conhecíamos alguns bons carpinteiros e então a equipe estava formada. No início era só eu e o Paulo e minha mãe como secretária, depois vieram os estagiários, Bruna Takeda, Renata Brandão, Isabela Meiwa. Outros arquitetos foram se juntando à nossa equipe técnica, Beni Derdyk e Felipe Junqueira. Por último veio o engenheiro Márcio Sartorelli em 2018.

No início a gente fazia pequenas obras de madeira, ainda decks, casas térreas e grandes pergolados. Foi então que em 2012 surgiu a oportunidade de fazer o Shopping Iguatemi de Fortaleza. Essa história merece uma aula dedicada só pra ela e contarei mais tarde. O fato é que a obra do Shopping fez com que a gente tivesse condições de contratar mais gente, nos abastecermos de softwares de desenho como o CadWork e o software de cálculo de estruturas RFEM, a qual temos a primeira licença do Brasil para madeiras.

A Carpinteria ganhou dois grandes prêmios Talento, o maior prêmio de engenharia do Brasil, com o shopping Iguatemi de Fortaleza e a Escola de Vela de Ilhabela.

Algumas obras do início da Carpinteria foram o restaurante JAM Warehouse no Itaim Bibi. Um grande galpão de madeira roliça de eucalipto.

Casa Félix, uma obra de madeira serrada de Itaúba com arco curvo de madeira pregada e colada feito na obra.

Shopping Iguatemi Fortaleza, uma das maiores obras de madeira engenheirada da América Latina. Um marco nas estruturas de madeira do Brasil.

Casa Catuçaba de Márcio Kogan. Sua primeira experiência com estruturas de madeira foi conosco nessa bela casa nas montanhas de São Luís do Paraitinga.

Na sequência da Casa Catuçaba, Kogan projetou a volume C da Micasa em são Paulo, um galpão de 15x15m de estrutura de madeira. A qual projetamos, detalhamos e montamos.

Última grande obra da fase apenas Carpinteria, já em parceria com a CROSSLAM, projetamos e montamos as quadras e marquises da escola Concept em São Paulo, de projeto da Triptyque.

São quase 3000 m2 de madeira engenheirada e uma das maiores obras de São Paulo.

Mais de vinte anos se passaram desde que eu construí meu primeiro deck de madeira até as grandes obras em estrutura de madeira espalhadas pelo país. Agora chegou a hora de fazer algo maior, como a construção de prédios de madeira.

Esta será nossa próxima história. Até breve!

Texto : Eng. Alan Dias